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Natiruts manda toda a negatividade embora no novo álbum

Quando se pensa em reggae nacional, é quase impossível não associá-lo automaticamente ao Natiruts. A banda existe desde 1996 e é um dos maiores nomes brasileiros quando o assunto é o gênero musical. “A idealização começou em 93, já com a ideia de misturar música brasileira com reggae”, conta o vocalista e compositor Alexandre Carlo ao Apple Music. “Isso não mudou, mesmo depois de tanto tempo, porque é a minha característica. Além do baixo do Luís Mauricio, que é o peso da sonoridade.”

Com canções que contêm a assinatura musical típica do Natiruts, a banda lança Good Vibration, álbum que chega durante a pandemia do coronavírus, momento que, o músico acredita, tem mostrado para as pessoas que “cultura vai além de apenas entretenimento, pois tem uma série de outras funções na sociedade”. Em um tempo tão difícil, há a importância de tentar melhorar a vibração de quem escuta o novo álbum, uma responsabilidade que o músico acredita fazer parte do trabalho. “A obra do Natiruts é uma das que, nos últimos 20 anos, ajudou bastante a construir a noção de empatia e ética do jovem no Brasil”, explica. No entanto a escolha não foi exatamente proposital, pois cantar a positividade já faz parte da banda desde sempre. “O tema de boas vibrações é um dos mais abordados pelo Natiruts, então não foi preparado por causa da pandemia. Temos que pensar no futuro, na esperança de que tudo vai dar certo, e a gente realmente acredita nessa questão das boas vibrações”, conta Alexandre Carlo. “Como acontece com toda cultura que foi relevante, ela uma hora vira moda, e a cultura ‘good vibration’ vem da África ancestral; no caso do reggae, vem da Etiópia, do Egito, da linguagem das pirâmides, de energias, chacras e tudo mais. Por isso que Bob Marley cantava ‘Positive Vibration’, e é disso que estamos falando. E não me incomoda quando alguém está na praia, feliz, e tira uma foto fazendo o símbolo da paz com a mão e escreve ‘good vibration’ na legenda, apesar desse momento ruim.” Para o músico, não tem por que querer vibrar com algo ruim. “Negatividade já vem com a realidade do mundo, né? Já sentimos a angústia e o vazio diariamente, então pode ser que a música ajude nos momentos ruins do dia a dia.”

Produzido durante o período de isolamento social, Good Vibration foi gravado no estúdio montado na casa de Alexandre Carlo. Foram poucas as visitas durante o processo, por isso o próprio músico gravou os teclados e as guitarras do álbum. “O que eu não pude fazer, enviei pela internet para outras pessoas da banda, então foi tudo bastante remoto.”

Abaixo, Alexandre Carlo conta detalhes e curiosidades das nove faixas de Good Vibration.

América Vibra
“Ela foi feita em 2019, e a ideia era que fosse o single de um DVD que lançaríamos em 2020, de um show que fizemos na Argentina, com 15 mil pessoas. Mas veio a pandemia e tudo parou, inclusive a turnê, que também se chamaria ‘América Vibra’. O mote da canção é mostrar a importância da América Latina se ver como um todo. Principalmente o Brasil em relação à América Latina espanhola. Como não rolou, a música ficou congelada, e aí veio uma sugestão de chamar alguém para participar. Eu quis o Ziggy Marley, e a ponte quem fez foi a gravadora. Foi muito legal ele ter aceitado e gostado da música. Ele até já conhecia o Natiruts, e eu não sabia disso, então foi um prazer gravar com ele, e legitima a banda como uma das que faz o reggae brasileiro ser reconhecido fora do país, afinal, o Ziggy, por ser filho do Bob Marley, é uma das maiores figuras do reggae atualmente. Tantos outros já tentaram, mas de fato é o Natiruts que consegue hoje quase que inventar um formato de reggae brasileiro que é respeitado pelos criadores, os jamaicanos. Também tivemos a participação da Yalitza Aparicio, ativista mexicana, que nunca tinha cantado, mas se saiu muito bem na parte em espanhol, porque eu não tinha pensado no muro do Donald Trump em relação ao México, mas caiu perfeitamente.”

Reggae Amor
“Com o Carlinhos Brown, meu amigo. Ele entrou em contato comigo para dizer que adorava o som e eu sugeri que ele viesse a Brasília quando ele pudesse para gravarmos aqui no meu estúdio, com a banda, lá em 2019. Então ele veio e fizemos uma sessão muito legal. Ele trouxe duas músicas, dois reggaes que ele tinha composto para o Natiruts. E um deles colocamos no álbum, que é ‘Reggae Amor’. É uma música que no arranjo, quando estávamos construindo, quisemos mesclar o reggae com música nordestina. O Carlinhos gravou a percussão toda e colocou notas de baião. Tem também a participação do filho dele, o Chico Brown. Foi um ambiente bem familiar.”

Quero Tudo Good Vibration
“Essa música inspirou o título do álbum e foi uma que eu fiz em 2020, quando eu li a biografia do Pixinguinha. No livro tem uma passagem contando que uma vez, ele, já bastante conhecido, foi receber um prêmio em uma festa no Copacabana Palace. Quando ele chegou lá, foi barrado por ser negro. E essa história me sensibilizou para falar da invisibilidade das figuras negras. Na época do Pixinguinha havia muito mais do que hoje, mas ainda existe. Então essa música fala disso. Talvez não de uma forma tão direta, mas a inspiração foi esse episódio do Pixinguinha, que depois fez a música ‘Lamento’ como maneira de refutar o que tinha acontecido. ‘Quero Tudo Good Vibration’ tem também a participação da IZA, que cantou divinamente, e as vozes se casaram de uma maneira muito bacana. E, como fala de invisibilidade, não é só da masculina, pois existem também as nossas heroínas negras ao logo da história que também foram podadas e diminuídas na sua importância na cultura brasileira, por isso a presença da voz feminina e negra nessa canção foi essencial para o resultado final.”

Ela
“Eu estou fazendo um projeto de reggae nacional apenas com artistas brasileiros do gênero. Nele, eu produzo as faixas junto com produtores de reggae que se chamam Unidade 76. Então chegou uma música para esse projeto de um compositor chamado Dja Luz, e era essa faixa. Eu gostei tanto que pedi a ele para colocá-la nesse álbum, comigo interpretando. Poucas vezes eu lancei coisas no Natiruts apenas como intérprete, porque 99% foi como autor. Ele gostou da ideia, o Luís gravou o baixo e assim nasceu ‘Ela’.”

Rosas no Teu Coração
“Essa foi uma música que nasceu de uma promoção que o Natiruts fez no Dia dos Namorados, acho que em 2017, e quem ganhou foi um casal do Chile. Baseado nessa história, eu fiz essa canção. Tem uma parte em que falo ‘neves e montanhas atravessei’, porque ela era chilena e ele brasileiro, então foi uma menção à Cordilheira dos Andes. Essa música, por ter um charme latino, a gente entendeu que ficaria muito boa na voz do Macaco, um artista espanhol muito amigo nosso, ativista, talentoso e muito gente boa. E a gente buscou mesclar o reggae brasileiro com a música mediterrânea, então as pessoas podem notar uma linha meio flamenca, da região de Barcelona.”

Que Bom Você de Volta
“Essa música já tinha sido gravada, então essa é uma releitura. Chegou uma sugestão da gravadora de uma cantora da Costa Rica chamada Debi Nova, e eu já havia assistido a uma premiação em que ela tinha sido indicada e escutado a umas duas músicas dela. E eu não tinha nenhuma composição que eu achava que combinasse com a voz doce dela, e aí me lembrei dessa música, que também tem um lado bastante caribenho e latino, e a gente resolveu resgatá-la e convidar a Debi.”

De Tanto Sol
“Uma música minha, a mais despretensiosa do álbum, uma música para ouvir na praia mesmo, olhando o mar, tanto que fala isso na letra. Essa tem a participação do Melim, um trio vocal que eu admiro muito, e eles sempre manifestaram uma influência do Natiruts na carreira deles, e por isso eles já estavam no meu radar. Eu estava procurando uma música que fosse adequada para eles e, como havia uma parte para uma cantora, casou perfeitamente. A Gabi fez as partes solo e os meninos abriram as vozes nos refrãos, ficou maravilhoso.”

Dia Perfeito
“Um dia eu estava na internet, já durante a pandemia, e eu vi o Zeider, do Planta e Raiz, que disse, numa publicação, que estava compondo. Então eu mandei uma mensagem para ele e disse que estava gravando um álbum e queria gravar músicas de outros artistas de reggae. Perguntei se ele não tinha nenhuma música que eu pudesse cantar, e ele me mandou umas três, e eu adorei ‘Dia Perfeito’, porque se comunicava com as histórias das duas bandas. E assim nasceu essa parceria.”

Todo Bien
“Essa música era originalmente em português, e antes da pandemia o Pedro Capó [cantor porto-riquenho] veio tocar em Brasília, e a gravadora aproximou a gente. Rolou uma empatia bem grande entre a gente e decidimos fazer uma parceira. Depois eu enviei a versão em português para ele, que adorou e perguntou se poderia sugerir ao produtor dele, lá de Miami, se daria para fazer uma versão com beat, o que eu adorei. E assim nasceu ‘Todo Bien’, com ele cantando em espanhol e a gente em português.”

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